Um juiz federal do Distrito Federal autorizou, em caráter liminar, que psicólogos possam atender eventuais pacientes que busquem terapia para reorientação sexual. A decisão atendeu a uma ação de três psicólogos que pediam a suspensão de uma resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que estabelece como os profissionais da área devem atuar nos casos que envolvam a orientação sexual de pacientes. O conselho irá recorrer da decisão. Publicada em março de 1999, a Resolução nº 1 do CFP proíbe os psicólogos de exercerem qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, bem como de colaborarem com eventos ou serviços que proponham o tratamento e a cura da homossexualidade.
A determinação, segundo o CFP, baseia-se no
entendimento da Organização Mundial de Saúde (OMS) de que a homossexualidade
não é uma doença, um distúrbio, nem uma perversão. Assim, na avaliação do
conselho, a forma como cada um vive sua sexualidade faz parte da identidade do
sujeito, cabendo aos profissionais de psicologia única e exclusivamente
contribuir para a superação dos preconceitos e das discriminações.
Para os autores da ação popular que questiona a
resolução, a iniciativa do CFP impede os psicólogos não só de atender eventuais
pacientes que procurem ajuda para tentar reverter sentimentos ou comportamentos
que lhes provoquem desconfortos ou transtornos, como de desenvolver estudos
científicos sobre a possível reversibilidade de práticas homoeróticas,
restringido a liberdade de pesquisa dos profissionais.
A partir das informações fornecidas pelas partes, o
juiz da 14ª Vara do Distrito Federal, Waldemar Cláudio de Carvalho, acatou
parcialmente o pedido dos críticos da resolução. Sem suspender os efeitos
gerais da regulamentação do conselho, o magistrado determinou que deve ser
facultado aos profissionais interessados a possibilidade de pesquisar o tema ou
atender os pacientes que os procurarem buscando a chamada reorientação sexual.
Em sua decisão, o juiz afirma que a resolução do CFP
não é inconstitucional, embora possa, “se mal interpretada”, levar a equívocos,
como a proibição à realização de estudos ou mesmo ao atendimento relacionado à
orientação ou reorientação sexual. Para o magistrado, em conformidade com o
princípio constitucional que garante a liberdade científica, deve estar claro
que os psicológicos estão aptos a estudar ou atender quem, voluntariamente,
buscar orientação psicológica acerca de sua sexualidade.
“Resta evidenciada, pela interpretação da Resolução
nº 1 do CFP, no sentido de proibir o aprofundamento dos estudos científicos
relacionados à (re)orientação sexual, afetando, assim, a liberdade científica
do país e, consequentemente, seu patrimônio cultural, na medida em que impede e
inviabiliza a investigação da sexualidade humana”, conclui Carvalho. Segundo o
juiz, o impedimento afeta principalmente os “eventuais interessados nesse tipo
de assistência psicológica”.
Apesar da decisão que cassa em parte os efeitos da resolução
do CFP, o juiz critica o Projeto de Lei 4.931, que tramita na Câmara dos
Deputados, e preconiza a chamada “cura gay”. Segundo ele, a proposta é
“passível de críticas, na medida em que parece equiparar a homossexualidade a
outros transtornos da sexualidade”.
Aplicação
Para
o advogado Leonardo Loiola Cavalcanti, que representa os autores da ação
popular, a liminar permitirá que os psicólogos comecem a atender adequadamente
as pessoas que não se aceitam em sua orientação sexual, sem o receio de serem punidos
pelo conselho.
Já
para o CFP, a decisão judicial abre uma perigosa possibilidade de uso de
terapias de reversão sexual, prática que o conselho afirma representar “uma
violação dos direitos humanos e que não tem qualquer embasamento científico”. O
conselho afirma haver evidências científicas, técnicas e jurídicas demonstrando
que as terapias de reversão sexual não só são ineficazes, como podem provocar
sequelas e agravar o sofrimento psíquico.
Na avaliação do conselho, o
juiz Waldemar Cláudio de Carvalho se equivocou ao definir como os psicólogos
devem interpretar a resolução de seu próprio órgão de classe. “O Poder
Judiciário se equivoca ao desconsiderar a diretriz ética que embasa a
resolução, que é reconhecer como legítimas as orientações sexuais não
heteronormativas, sem as criminalizar ou patologizar. A decisão do juiz,
valendo-se dos manuais psiquiátricos, reintroduz a perspectiva patologizante,
ferindo o cerne da Resolução 01/99.” FONTE: PORTALNOAR
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